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Reforma dos fundos do mercado monetário: reforma necessária, redução temporária?

Funds People

26/6/2019

Na ressaca da crise financeira de 2008/9 e perante a vulnerabilidade demonstrada pelo mercado monetário, em especial perante um cenário de resgate súbito substancial, ficou demonstrado, por um lado, a importância deste mercado e o risco de contágio que o mesmo representava para o sistema financeiro em geral e, por outro lado, as falhas de regulação existentes neste mercado específico.

Perante esta evidência, logo em 2010 a CESR (antecessora da ESMA – European Securities and Markets Authority) debruçou-se sobre o tema, emitindo orientações relativas a uma definição comum de fundos europeus do mercado monetário, com requisitos de composição de carteira e critérios de gestão de riscos que visavam a harmonização do mercado. Não obstante, a limitada aplicabilidade das regras aí previstas – tendo sido apenas implementadas em 12 Estados Membros, incluindo Portugal, onde foram adotadas através do Regulamento da CMVM n.º 01/2013 -, conduziram à necessidade de adoção do Regulamento (UE) 2017/1131 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, relativo aos fundos do mercado monetário (FMM).

Este Regulamento, em vigor desde 21 de julho de 2018 para novos fundos e desde 21 de janeiro de 2019 para fundos pré-existentes, organizou os FMM em três tipos:

  • FMM com valor líquido variável (FMM VLV);
  • FMM com valor líquido de baixa volatilidade (FMM VLBV);
  • FMM de dívida pública com valor líquido constante (FMM de dívida pública VLC).

Elemento essencial dos FMM é o seu investimento em ativos de curto prazo, apresentando-se assim os FMM VLV como de curto prazo (em que as carteiras de investimento têm uma maturidade média ponderada (MMP) não superior a 60 dias e uma duração média ponderada (DMP) em regra não superior a 120 dias) ou normais (carteiras com uma MMP não superior a seis meses e DMP em regra não superior a 12 meses). Tanto o FMM VLBV como o FMM de dívida pública VLC apenas são admissíveis na modalidade de curto prazo.

Para além desta tipificação, foram ainda introduzidas alterações significativas, com vista ao reforço da proteção dos investidores, com destaque para:

  • Necessidade de diversificação da carteira de forma a limitar riscos e, em regra, proibição de concentração de mais de 10% dos instrumentos emitidos por uma única entidade, evitando assim influências significativas;
  • Procedimentos extensos de avaliação interna da qualidade de crédito;
  • Política de know your customer que permitam antecipar o efeito de resgates simultâneos através de um melhor conhecimento dos respetivos investidores, suas práticas de investimento e exposição ao risco;
  • Testes de esforço mais profundos com vista a antecipar possíveis acontecimentos ou alterações nas condições económicas que afetem negativamente os FMM;
  • Avaliação dos FMM diária e, sempre que possível, com recurso a avaliação ao preço de mercado (mark to market);
  • Proibição de apoios esternos aos FMM, devido à natureza discriminatória e incerta que este tipo de patrocínios representa;
  • Novos rácios de liquidez (diária e semanal) impostos consoante os diferentes tipos de FMM.

Se somarmos à maior complexidade resultante da densificação normativa efetuada pelo Regulamento – não esquecendo o custo de implementação e constante atualização das medidas aí previstas – ao facto de a rentabilidade dos FMM se encontrar diretamente relacionada com as taxas do mercado monetário – historicamente baixas e em terreno negativo desde final de 2015 -, será fácil perceber a menor popularidade que os FMM têm recolhido junto de investidores e gestores de FMM.

Na verdade, em 2018 o mercado de FMM em Portugal apresentou um decréscimo de 8,7% face ao ano anterior, com um elevado número de resgates. Ainda assim, o ano de 2018 fechou com um total de 11.221 Milhões de Euros de ativos sob gestão dos FMM e uma quota de mercado de 24%.

Também em Espanha se verificou uma redução significativa nos últimos anos, motivada pela baixa rentabilidade, passando os FMM a representar apenas 3,3% do montante total investido pelos FMM, no lugar dos 40% de quota anteriormente representados.

Em qualquer dos cenários, sempre se dirá que, apesar de uma menor atratividade atual, o papel de relevo que os FMM representam na economia e, em particular, na gestão de tesouraria a curto prazo de empresas, instituições financeiras e administrações públicas não oferecem dúvidas quanto à necessidade de regulamentação destas matérias.

Em 2022, na revisão já anunciada que a Comissão irá fazer do Regulamento, poderemos então verificar se a tendência de arrefecimento deste mercado verificada nos últimos tempos se manteve ou foi entretanto invertida. Para a inversão desta tendência assumimos como fatores mais decisivos no imediato dois cenários: um eventual (mas pouco provável) aumento do retorno oferecido; ou um acentuar de instabilidade dos mercados financeiros que se têm apresentado como alternativa aos FMM.

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Autores

Retrato deTiago Valente de Oliveira
Tiago Valente de Oliveira
Sócio
Lisbon