No âmbito do Programa Simplex + 2016, o Governo, através do Decreto-Lei n.º 80/2017 de 30 de Junho introduziu alterações ao regime jurídico dos empreendimentos turísticos (a quinta alteração em nove anos vigência do diploma). Sem prejuízo de algumas alterações meritórias e oportunas, destaca-se pela negativa, o completo “esvaziamento” de competências do Instituto de Turismo de Portugal, I.P. (ITP), designadamente no que respeita ao processo de licenciamento de empreendimentos turísticos.
Até à entrada em vigor desta alteração – que ocorreu no passado dia 1 de julho – o ITP dispunha de amplos poderes, cabendo-lhe em particular a emissão de parecer prévio vinculativo à realização de operações urbanísticas de empreendimentos turísticos. Tal competência era particularmente relevante no procedimento em questão na medida em que através da emissão do parecer, o ITP verificava, numa fase ainda embrionária do projeto, o cumprimento da legislação aplicável e ainda aferia da adequação dos novos projetos turísticos (do ponto de vista estratégico e arquitetónico).
Com as alterações ora introduzidas é eliminada a necessidade de tal parecer vinculativo por parte do ITP (com exceção das operações de loteamento) passando a ser os Municípios onde se localizem os novos empreendimentos turísticos a assumir todo o procedimento de licenciamento. O ITP poderá – e apenas a pedido dos interessados – emitir parecer (facultativo e não vinculativo) e ficará cometido à simples tarefa de, in fine, proceder à classificação dos empreendimentos turísticos.
O legislador justifica as alterações introduzidas, em especial no que toca à redução de competências do ITP no âmbito do licenciamento, com um desígnio de maior “simplificação de procedimentos” e “agilidade nos processos de decisão”. No entanto numa análise mais detalhada, cremos que tais medidas introduzem ao invés, desorientação, entropia e incerteza num sector tão relevante para a economia nacional.
Maior desorientação uma vez que, ao retirar a intervenção do ITP numa fase ainda embrionária da implementação de projetos turísticos, o setor do turismo perde um “regulador” amplamente especializado e experiente na averiguação da oportunidade e pertinência da implementação de novos empreendimentos turísticos. Tal é tanto mais relevante, num momento em que se assiste a um boom (por vezes descontrolado) do setor do turismo em Portugal. Maior entropia, uma vez que o processo de licenciamento passará agora a ser totalmente coordenado e apreciado pelos Municípios, entidades já muito sobrecarregadas em termos de competências e em alguns casos sem recursos humanos especializados na matéria (a título de exemplo, atente-se às enormes dificuldades dos Municípios na assunção de novas competências no âmbito do novo regime de licenciamento industrial).
E, por fim, maior incerteza, uma vez que, cabendo ao ITP a última palavra no âmbito do procedimento em questão (com a atribuição da classificação do empreendimento turístico), e atenta a sua ausência em fases anteriores, o promotor apenas saberá da viabilidade (ou da inviabilidade) do seu empreendimento na fase final (quando o mesmo se encontra construído e aberto ao público). Tal introduz incerteza e risco uma vez que, no limite, o ITP poderá determinar a não atribuição de classificação e a consequente caducidade da autorização de utilização para fins turísticos previamente emitida (com as suas múltiplas consequências, por exemplo ao nível do financiamento).
Desorientação, entropia e incerteza nunca são boas notícias para o setor que mais tem contribuído para o crescimento da economia portuguesa e para a captação de investimento estrangeiro.
Bernardo Cunha Ferreira
Advogado, CMS-RPA
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