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Meet The Law - Alojamento Local: Acórdão Uniformizador de Jurisprudência

No passado dia 10 de maio de 2022 foi publicado, em Diário da República, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2022 (de ora em diante “Acórdão”) com o seguinte sumário: “No regime da propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo, de que certa fracção se destina a habitação, deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a realização de alojamento local.”

Questão em causa

O Acórdão em apreço vem orientar a jurisprudência na resposta à seguinte questão: 
‑ Se a fração autónoma destinada a habitação não pode ser utilizada para alojamento local sob pena de violar o fim a que esta se destina, segundo o título constitutivo da propriedade horizontal.

Percurso judicial

Antes do processo em causa ser analisado pelo Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça, o tribunal de primeira instância entendeu que era ilegal a utilização de uma fração autónoma para estabelecimento de alojamento local, face à menção de habitação atribuída pelo título constitutivo.

Posteriormente, e interposto recurso pelos réus neste processo, o tribunal da Relação confirmou o entendimento do tribunal acima aludido, tendo sido, de seguida, interposto recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça que (também) confirmou o acórdão da Relação.

Inconformados os réus, interpuseram ainda recurso para uniformização de jurisprudência.

Acórdão Fundamento

Como fundamento para interporem o recurso de uniformização de jurisprudência, os réus alegaram, entre outros fundamentos, o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 28 de março de 2017 que entendeu que “na cedência onerosa da fracção a turistas, a fracção autónoma destina-se à respetiva habitação e não a actividade comercial, respeitando o conteúdo do título constitutivo da propriedade horizontal onde consta que determinada fracção se destina a habitação, se essa fracção for objeto de alojamento local”, além de entenderem que o alojamento local não se trata de um ato de comércio.

Assim, verificando-se que o acórdão fundamento está em clara contradição com o acórdão ora recorrido nas mesmas questões fundamentais de direito, e também verificados os demais requisitos, o recurso para uniformização de jurisprudência interposto foi aceite.

Fundamentos alegados para sustentar a posição do acórdão uniformizador

Dos fundamentos invocados pelo Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça para sustentarem a interpretação perfilhada no acórdão em causa, destacamos os seguintes:

• Os serviços proporcionados pelo explorador de alojamento local ao utente alojado através do uso da fração autónoma distinguem-se da prestação do gozo habitacional “por natureza com um grau de permanência e estabilidade que não se verificam nos casos de alojamento local”, ainda que requeira condições de habitabilidade;

• A atividade de exploração de alojamento local é definida, nos termos da legislação aplicável, enquanto o exercício, por pessoa singular ou coletiva, da atividade de prestação de serviços de alojamento;

• O alojamento local não é tributado como habitação;

• O sentido do acórdão em causa não contraria o disposto na Constituição da República Portuguesa relativamente à propriedade privada, uma vez que esta não é absolutizada, comportando, assim, os limites impostos pelas particularidades do regime legal da propriedade horizontal, nomeadamente a proibição de dar à fração autónoma destino diferente daquele que é previsto no título constitutivo da propriedade horizontal.

Declaração de voto

Encontram-se ainda no acórdão em apreço declarações de voto de Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça que, de forma sumária, referem o seguinte:

Para um dos Conselheiros, a legislação aplicável ao Alojamento Local prevê apenas uma situação em que é necessária a autorização prévia do condomínio para a exploração do alojamento local na fração autónoma - caso dos “hostels”. Assim, “está a permitir, genérica e incondicionalmente, em todas as demais situações (…) a exploração de estabelecimento local em fracções autónomas de edifícios destinadas a ‘habitação’”, pressupondo, desta forma, que a sua utilização não viola o destino de habitação dado pelo respetivo título constitutivo.

Por outro lado, outro Conselheiro reconhece que a opção defendida no acórdão em causa pode ser prejudicial para os interesses dos proprietários das frações autónomas que pretendem rentabilizar os seus ativos, mas, considerando o quadro legal em vigor, “ela acaba por, de modo preventivo, tutelar os interesses de sossego e segurança dos residentes habituais de um imóvel de habitação coletiva.

 

Autores

Retrato deJoão Pinheiro da Silva
João Pinheiro da Silva
Sócio
Lisbon
Retrato deCarlos Henriques Saraiva
Carlos Henriques Saraiva
Associado
Lisbon