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Transposição do Terceiro Pacote Energético da União Europeia

26/10/2012

Foram publicados, nos dias 8 e 26 de Outubro, os diplomas que transpõem o Terceiro Pacote Energético da União Europeia, constante das Diretivas n.º 2009/72/CE e n.º 2009/73/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho, alterando os diplomas concernentes ao setor elétrico e ao setor do gás natural.

Os diplomas em causa são os Decretos-Lei n.º 215-A/2012 e n.º 215-B/2012, para o sector da eletricidade e os Decretos-Lei n.º 230/2012 e n.º 231/2012, para o setor do gás natural.

Na linha dos compromissos assumidos pelo Governo Português no Memorando de Entendimento com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, a transposição do Terceiro Pacto Energético tem como principais objetivos:

  1. A conclusão do processo de liberalização dos sectores da eletricidade e do gás;
  2. A promoção a concorrência e a transparência, designadamente através do reforço da separação das atividades de produção, de transporte, de distribuição e de comercialização;
  3. O fortalecimento dos poderes regulatórios da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE);
  4. O reforço dos direitos do clientes e incentivo ao investimento em benefício dos consumidores de eletricidade e gás natural.

Resumimos abaixo as alterações mais relevantes introduzidas nos sectores do gás natural e da eletricidade.

Sistema Elétrico Nacional 
Decreto-Lei n.º 215-A/2012, de 8 de Outubro

Altera e republica o Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de Fevereiro, que estabelece as bases gerais de organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional, bem como as bases gerais aplicáveis ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade.

O presente diploma procede à revisão do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de Fevereiro, transpondo a Diretiva n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho, que estabelece as regras comuns para o mercado interno de eletricidade.

Entre as alterações mais significativas, merece destaque a redefinição dos conceitos de «produção em regime ordinário» e de «produção em regime especial», deixando esta última de se distinguir da primeira apenas pela sujeição a regimes jurídicos especiais no âmbito de políticas de incentivo, na medida em que abrange igualmente a produção de eletricidade em regime remuneratório de mercado.

Por seu turno, relativamente à atividade de transporte de eletricidade, são reforçadas as exigências de independência e de separação jurídica e patrimonial do operador da Rede Nacional de Transporte de Eletricidade (RNT), ao mesmo tempo que se prevê um procedimento de certificação e de avaliação da separação jurídica e patrimonial nos casos em o operador da RNT é controlado por entidade(s) de país(es) terceiros à União Europeia.

Apesar da separação jurídica e patrimonial da atividade de transporte ser já uma realidade no nosso quadro normativo, definem-se agora dois modelos alternativos de separação nos casos em que a entidade reguladora (ERSE) conclua que a concessionária da RNT integra uma empresa verticalmente integrada e que não reúne as condições de separação jurídica e patrimonial exigidas.

Nestes casos, a ERSE pode impor ao operador da RNT a adoção de determinados atos, bem como das medidas necessárias para assegurar o cumprimento integral das condições relativas à separação jurídica e patrimonial, podendo a concessionária da RNT requerer, em alternativa, a sua designação como Operador de Transporte Independente (OTI).

Foram igualmente revistos os requisitos em matéria de separação jurídica do operador da rede de distribuição e reforçadas as exigências de independência do operador relativamente às atividades de comercialização e produção, eliminando o risco de discriminação no acesso às redes e impedindo a troca de informações de natureza confidencial.

Quanto à comercialização de eletricidade, prevê-se, em articulação com a redefinição do conceito de produção em regime especial, que o comercializador de último recurso mantenha a obrigação de adquirir a eletricidade produzida em regime especial enquanto esta beneficiar de tarifa ou outra remuneração garantida.

Por fim, destacamos ainda a criação da figura do facilitador de mercado, a quem é atribuída, mediante licença, a obrigação de aquisição da energia produzida em regime especial com remuneração de mercado.

Decreto-Lei n.º 215-B/2012, de 8 de Outubro

Altera e republica o Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de Agosto, que desenvolve os princípios constantes do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de Fevereiro.

Na linha da alterações introduzidas no Decreto-Lei n.º 29/2006, o presente diploma desenvolve as bases gerais da organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional e, simultaneamente, transpõe os artigos 13.º e 16.º da Diretiva n.º 2009/28/CE, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis e à integração do regime do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho, que estabelece os princípios e as regras de simplificação da prestação de serviços em território nacional.

Em primeiro lugar, o âmbito de aplicação do regime é alargado, pois apenas se exclui a sua aplicação (i) à produção em cogeração, à microprodução, à miniprodução e à produção de eletricidade a partir da energia das ondas na zona piloto; (ii) à produção de eletricidade a partir de energia nuclear; e (iii) às redes de distribuição fechadas.

A par da alteração do conceito de «produção em regime ordinário» e de «produção em regime especial», procede-se à consolidação do regime de produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, sendo definido um procedimento de licenciamento comum e uniformizado.

O presente diploma redefine, ampliando, o conceito de «fontes de energia renováveis» sendo entendidas como tal as fontes de energia não fósseis renováveis nomeadamente eólica, solar, aerotérmica, geotérmica, hidrotérmica, oceânica, hídrica, biomassa, gases dos aterro, gás proveniente de instalações de tratamento de águas residuais e biogases.

Neste novo enquadramento, o exercício da atividade de produção em regime especial está sujeito a controlo prévio, mediante a atribuição de uma licença de produção ou de comunicação prévia para instalação de centros electroprodutores.

Está sujeita a licença de produção a instalação dos centros electroprodutores quando: 

  • A potência de ligação à rede seja superior a 1 MVA; 
  • A instalação do centro electroprodutor esteja sujeita aos regimes jurídicos de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais; 
  • A instalação do centro electroprodutor esteja projetada para espaço marítimo sob a soberania ou jurisdição nacional, ou; 
  • O regime remuneratório aplicável seja o da remuneração garantida.

Os demais casos estão sujeitos a comunicação prévia, cuja regulação se remete para diploma complementar - Regulamento do Procedimento Administrativo de Comunicação Prévia.

À semelhança do previsto para a produção em regime ordinário, a licença de produção em regime especial não tem prazo de duração, salvo quando a eletricidade produzida provenha de fonte hídrica do domínio público ou o centro electroprodutor se destine a ser instalado em espaço marítimo ou sob soberania ou jurisdição nacional, caso em que a licença fica sujeita ao prazo estabelecido no respetivo título de utilização.

Prevê-se ainda a sujeição ao procedimento de avaliação das incidências ambientais nos casos em que a emissão de licença de produção não se encontre abrangida pelo regime de avaliação de impacte ambiental e esteja localizada em área Reserva Agrícola Natural, Reserva Ecológica Natural, Rede Natura 2000 ou Rede Nacional de Áreas Protegidas.

Relativamente ao regime remuneratório, a atividade de produção em regime especial pode ser exercida de acordo com os seguintes regimes: 

  • Regime geral - em mercados organizados ou através da celebração de contratos bilaterais com clientes finais ou comercializadores de eletricidade; 
  • Regime de remuneração garantida - eletricidade produzida é entregue ao comercializador de último recurso contra remuneração.

Com o propósito de simplificar as regras de acesso e de exercício da atividade de comercialização, estatui-se um procedimento de registo célere.

Por outro lado, acresce, ainda, aos deveres do comercializador de último recurso, o fornecimento de eletricidade em locais onde não exista oferta de comercializadores em regime de mercado e o fornecimento de eletricidade aos clientes cujo comercializador tenha ficado impedido de exercer a atividade de comercialização.

Inovadoramente, é criada a figura do facilitador de mercado, que fica obrigado a adquirir a energia produzida pelos produtores em regime especial com regime remuneratório geral que pretendam vender-lhe a referida energia , ficando obrigado à sua colocação em mercado.

Por fim, relativamente ao regime transitório, prevê-se que as autorizações e licenças de produção de eletricidade em regime especial e em regime ordinário já emitidas sejam reguladas pelo regime ora alterado, à exceção dos aproveitamentos hidroelétricos para os quais tenham sido emitidas licenças de produção em regime ordinário que passam a reger-se pelo regime aplicável à produção de eletricidade em regime especial, mantendo-se as condições remuneratórias existentes.

Sistema Nacional de Gás Natural 
Decreto-Lei n.º 230/2012, de 26 de Outubro

Altera e republica o Decreto-Lei n.º 30/2006, de 15 de Fevereiro, que estabelece as bases gerais de organização e funcionamento do Sistema Nacional de Gás Natural, bem como as bases gerais aplicáveis ao exercício das atividades de receção, armazenamento, transporte, distribuição e comercialização de gás natural e à organização dos mercados de gás natural.

O presente diploma procede à revisão do Decreto-Lei n.º 30/2006, de 15 de Fevereiro, e completa a transposição da Diretiva n.º 2009/73/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, que estabelece as regras comuns para o mercado interno de gás natural, e do Regulamento (CE) n.º 715/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho, relativo às condições de acesso às redes de transporte de gás natural.

A par de precisões terminológicas dos conceitos a aplicar, o presente diploma reforça as regras de separação jurídica das atividades desenvolvidas no âmbito do Sistema Nacional de Gás Natural (SNGN) e estabelece o procedimento de certificação e avaliação das condições de separação jurídica e patrimonial do operador da Rede Nacional de Transporte de Gás Natural (RNTGN) quando seja controlado por entidade(s) de país(es) terceiros à União Europeia.

Inovadoramente, o presente diploma prevê que as disposições relativas ao acesso às redes de transporte e distribuição e à comercialização, são aplicáveis ao biogás e ao gás proveniente da biomassa, ou a outros tipos de gás se, do ponto de vista técnico, de qualidade e de segurança, os referidos gases poderem ser injetados e transportados nas redes de gás natural.

À semelhança do previsto para o sector elétrico, definem-se agora dois modelos alternativos de separação jurídica e patrimonial da concessionária da rede de transporte face às atividades de comercialização e de produção de eletricidade e de gás natural, nos casos em que a entidade reguladora (ERSE) conclua que a concessionária da RNTGN integra uma empresa verticalmente integrada e que não reúne as condições de separação jurídica e patrimonial exigidas.

Nestes casos, a ERSE pode impor ao operador da RNTGN a adoção de determinados atos, bem como das medidas necessárias para assegurar o cumprimento integral das condições relativas à separação jurídica e patrimonial, podendo a concessionária da RNTGN requerer, em alternativa, a sua designação como Operador de Transporte Independente (OTI).

Decreto-Lei n.º 231/2012, de 26 de Outubro

Altera e republica o Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de Julho, que estabelece os regimes jurídicos aplicáveis às atividades de transporte de gás natural, de armazenamento subterrâneo de gás natural, de receção, armazenamento e regaseificação em terminais de gás natural liquefeito (GNL) e de distribuição de gás natural.

Na linha da alterações introduzidas no Decreto-Lei n.º 30/2006, o presente diploma desenvolve as bases gerais da organização e funcionamento do Sistema Nacional de Gás Natural que completa a transposição da Diretiva n.º 2009/73/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, que estabelece as regras comuns para o mercado interno de gás natural.

A par do reforço das regras de separação jurídica das atividades exercidas no âmbito do Sistema Nacional de Gás Natural, o presente diploma importa, do Regulamento das Relações Comerciais, os conceitos de comercializador de último recurso grossista e de comercializador de último recurso retalhista.

Neste sentido, o comercializador de último recurso retalhista é definido como o titular de licença de comercialização de último recurso, sendo responsável (i) pelo fornecimento de gás natural a clientes finais com consumos anuais inferiores ou iguais a 10 000 m3, enquanto vigorarem as tarifas reguladas ou as tarifas transitórias estabelecidas e, após a extinção destas, aos clientes finais economicamente vulneráveis; (ii) pelo fornecimento de gás natural aos clientes cujo comercializador em regime de mercado tenha ficado impedido de exercer a sua atividade, bem como (iii) por assegurar o fornecimento de gás natural em locais onde não exista a oferta dos comercializadores em regime de mercado.

Por seu turno, o comercializador de último recurso grossista exerce a atividade de compra e venda de gás natural para fornecimento aos comercializadores de último recurso retalhistas.

Decreto-Lei n.º 212/2012, de 25 de Setembro

Procede à alteração dos estatutos da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), transpondo as Diretivas n.º 2009/72/CE e n.º 2009/73/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, que estabelecem as regras comuns para o mercado interno da eletricidade e do gás natural, respetivamente.

Foi publicado, no passado dia 25 de Setembro, o Decreto-Lei n.º 212/2012, que procede à alteração dos estatutos da ERSE, reforçando a independência e o os poderes regulatórios da ERSE, designadamente os de natureza sancionatória, em consonância com os compromissos assumidos pelo Governo Português no Memorando de Entendimento com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, no âmbito dos sectores da eletricidade e do gás natural, com o propósito e objetivo de concluir a liberalização dos referidos mercados, promovendo a concorrência e o reforço da integração no MIBEL e no MIBGÁS.

Fonte
Meet the Law - Energia
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Autores

Retrato deMónica Carneiro Pacheco
Mónica Carneiro Pacheco
Sócia
Lisbon